Doria mira vacina como marca, fixa vitrines, mas deixa promessas inacabadas
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Doria marcou 4% na última pesquisa Datafolha, de dezembro, e tem sido pressionado por alas do próprio partido a desistir da candidatura.
Amparado pela vacina contra a Covid e com vitrines em outras áreas, o presidenciável João Doria (PSDB) deixará o Governo de São Paulo sem ter conseguido capitalizar esse legado e com uma série de promessas inacabadas.
Doria marcou 4% na última pesquisa Datafolha, de dezembro, e tem sido pressionado por alas do próprio partido a desistir da candidatura.
Seus aliados apostam, porém, que o tucano pode deslanchar quando estiver dedicado inteiramente à campanha -a partir de 2 de abril, quando Doria deve deixar o governo, e seu vice, Rodrigo Garcia (PSDB), assumir o Palácio dos Bandeirantes.
Um levantamento da reportagem com 50 das principais promessas e metas da gestão Doria, assumidas durante a campanha ou já no governo, mostra que quase metade delas não foi realizada (24%) ou está em fase inicial (20%). Outras 12% foram concluídas, 16% estão em estágio avançado, e 28% seguem em andamento.
Entre as metas avançadas está a intenção de vacinar toda a população elegível. O governador foi o primeiro a trazer a vacina contra a Covid para o país e acabou pressionando o governo Jair Bolsonaro (PL) a correr atrás dos imunizantes.
Graças a doses extras compradas pelo estado, São Paulo, se fosse um país, estaria em terceiro lugar em cobertura vacinal -hoje, em 90,6% da população elegível.
Durante o processo da vacinação, Doria esteve presente em todos os momentos-chave, de entrevistas a entregas do produto no aeroporto, sem contar a pose ao lado dos primeiros vacinados e os embates com Bolsonaro.
Apesar de a exposição não ter rendido os frutos esperados até aqui, membros da campanha de Doria afirmam que a vacina será um ativo e, mais do que isso, tornou-se a marca do tucano.
Embora Doria tenha também outros feitos na gestão, com avanços na segurança pública e na qualidade da água do rio Pinheiros, estrategistas afirmam que a fórmula de apresentar na campanha vitrines em solo paulista não serve para arrebatar brasileiros e não deu certo nas candidaturas de José Serra e Geraldo Alckmin, por exemplo.
Por isso, a vacina cumpriria melhor o papel de cartão de visitas. A ideia é apresentá-la sem reforçar a imagem de marqueteiro e como exemplo de que um governo com gestão competente e planejamento pode antecipar soluções.
Da mesma forma, para que o catálogo de obras em São Paulo não soe arrogante, o plano é usá-lo como garantia de que Doria é capaz de executar o que imagina para o Brasil, pois o fez no governo paulista.
Auxiliares de Doria ressaltam que o governador terá exemplos de feitos em todas as áreas -a expansão do ensino integral na educação, a reforma do Museu do Ipiranga na cultura, as câmeras nos coletes dos policiais na segurança e a despoluição do rio Pinheiros no meio ambiente.
Com ritmo frenético de reuniões, entrevistas, viagens e inaugurações, Doria buscou se diferenciar dos governos tucanos, empregando um estilo de gestão empresarial mais do que político.
Apesar de tropeços na questão política, a fórmula rendeu bons frutos até de acordo com alguns adversários do tucano que, nos bastidores, afirmam que seu mandato teve mais entregas. A questão é que a avaliação do governo é contaminada pela avaliação de Doria, que colhe impopularidade depois de brigas com esquerda e direita.
Para o cientista político Bruno Silva, pesquisador do Laboratório de Política e Governo da Unesp Araraquara, o governador acabou pecando pelo excesso de exposição e marketing, que gera uma sensação de cansaço no eleitorado.
A vacinação e outras realizações não foram o suficiente para compensar o desgaste sofrido por Doria ao longo da gestão. Um dos fatores responsáveis por esse desgaste foi o descolamento de Bolsonaro após pegar carona no presidente para se eleger.
“Na pandemia, tem o Doria tentando se cacifar como uma espécie de pai da vacina, em oposição ao presidente Bolsonaro que o tempo todo negligenciou a pandemia. Doria antagoniza com o governo federal aprofundando uma divisão que já havia começado e que acaba pesando contra ele”, diz.
Silva afirma que o discurso do governo federal contra Doria, criticando as medidas de isolamento social e danos à economia, o prejudicou.
Em 2018, num contexto de campanha acirrada, Doria fez uma série de promessas mirando as obras paradas e os atrasos no metrô que marcaram o mandato de seu antecessor e padrinho, Alckmin -de quem hoje é rival.
Até o próximo dia 2, porém, Doria deixa o Palácio dos Bandeirantes sem ter inaugurado boa parte desses símbolos, como o Rodoanel, a linha 17-ouro do metrô e as melhorias na rodovia dos Tamoios -apenas alimentando a fama de lentidão das gestões tucanas iniciadas em 1995 no estado.
O governador prometeu iniciar a implantação do trem intercidades (ligação da capital com a região de Campinas) e construir habitações e creches em suas estações. Até agora, o projeto não saiu do papel.
Doria também se comprometeu a finalmente levar o metrô à região do ABC, uma promessa antiga que geralmente é retomada em ano eleitoral e que o tucano não vai cumprir.
Ele modificou o projeto e agora a região deve ganhar um BRT (corredor de ônibus rápido), cujas obras começaram no mês passado, no apagar das luzes do governo.
Outras propostas também só avançaram nesta reta final, como a construção do monotrilho no aeroporto de Guarulhos e o anúncio de aumento para servidores da educação e da segurança, que fora prometido na campanha. Mais um exemplo é o início das obras do piscinão Jaboticabal, na capital, no mês passado.
Símbolo de corrupção em governos do PSDB e protagonista entre as metas de Doria, o Rodoanel não teve sua retomada viabilizada com recursos do estado nesses três anos e tem o leilão previsto para abril.
Outra obra fantasma apontada pela oposição é a da linha 17-ouro do metrô, que deveria ter sido inaugurada para a Copa de 2014. Entre 2019 e 2020, Doria rescindiu o contrato e fez uma nova licitação para a retomada, mas o trecho previsto para 2022 ainda não está em operação.
Mesmo na área de privatizações, espécie de lema do tucano, Doria chegou a convocar a imprensa e fazer anúncios que nunca se concretizaram, como a concessão de presídios. O governo exalta, porém, a concessão do lote Piracicaba-Panorama de rodovias, com 1.273 quilômetros.
O esperado enxugamento da máquina atingiu estatais, mas não chegou ao primeiro escalão. O tucano prometeu reduzir o número de secretarias e governar com no máximo 22 pastas. Atualmente, há 27, embora quatro delas sejam “extraordinárias”, ligadas a outras secretarias.
Por outro lado, o governador conseguiu resolver imbróglios que permitiram a retomada de projetos das linhas 5-lilás, 6-laranja, 15-prata e 2-verde. Mas o mérito da inauguração dessas obras deve ficar para sucessores -a linha 6-laranja é prevista para 2025 e as extensões das linhas 5 e 2 para depois disso.
Na lista de avanços está o setor da segurança, com redução nos principais índices criminais, um programa elogiado de combate ao feminicídio e redução da letalidade policial.
Doria também apostou num programa extenso de recuperação de estradas e vicinais e lançou, na área social, o Vale do Futuro, com uma série de medidas para o desenvolvimento do Vale do Ribeira.
Outra meta de destaque é o número de unidades de escolas com ensino integral, que passou de 364 para 2.050. E uma das vitrines mais vistosas politicamente talvez seja o projeto de limpeza do rio Pinheiros, em fase avançada.
Secretário de Desenvolvimento Regional do governo Doria e presidente do PSDB em São Paulo, Marco Vinholi diz que o legado do mandato é histórico.
“Foram mais de R$ 100 bilhões investidos em todas as áreas. O estado hoje é um canteiro de obras graças às reformas executadas, gerando milhares de empregos por todo o território.”
Vinholi afirma ainda que a vacina tem “profundo valor humano”. “Não creio na utilização da vacina como atributo político, mas sim na propagação para a população brasileira da garra e da coragem de Doria para fazer o que é necessário”, completa.
Em nota enviada após a publicação da reportagem, a secretaria de Comunicação afirma que a pandemia impôs a “revisão de prazos, obras e programas, pois a gestão concentrou os seus recursos na área da Saúde […] e na mitigação de seus impactos sociais durante 2020 e 2021”.
“Algumas licitações foram prorrogadas por causa das incertezas econômicas no período e obras tiveram redução de ritmo por causa do isolamento social”, afirma. A nota diz ainda que a reportagem não considera que a gestão tem mais nove meses “e trabalha para que todos os projetos sejam iniciados”.
José Américo, deputado estadual do PT, afirma que a “fama de gestor de Doria é uma lenda urbana” e que seu governo é “mal resolvido e inoperante”.
“Em função do arrocho no funcionalismo, da venda de estatais e do aumento de impostos, o estado nunca teve tanta verba como agora. E, apesar disso, as obras que Doria retomou foram de forma tardia. Ele teve três anos para resolver a linha 6. O monotrilho foi retomado a passos de tartaruga. O Rodoanel é uma obra caríssima e abandonada, não saiu do lugar”, diz.
Américo avalia que a posição a favor da vacina foi positiva, mas diz que o governador foi “vacilante e contraditório” na aplicação de restrições e na retirada da obrigatoriedade de máscara.
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