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Livro sobre os ‘pecados da colonização portuguesa’ vira best-seller na Suécia


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O desempenho da obra surpreendeu: em duas semanas, a primeira edição se esgotou


Correspondente do jornal Dagens Nyheter, o maior da Suécia e da Escandinávia, Henrik Brandão Jönsson, 52, vive há 20 anos no Rio de Janeiro. Antes de se fixar no Brasil, o jornalista morou ainda em Portugal e em Cabo Verde, o que lhe rendeu um enorme interesse por tudo relacionado à lusofonia.

O entusiasmo de Brandão Jönsson com o tema acabou por convencer um editor da Suécia a publicar um livro sobre o universo da colonização portuguesa, com a provocadora premissa dos pecados espalhados pelos exploradores lusitanos.

Sem grandes expectativas, a editora programou o lançamento de “Viagem pelos Sete Pecados da Colonização Portuguesa” para agosto -principal mês das férias de verão na Europa e um período tradicionalmente pouco movimentado no mercado literário escandinavo.

O desempenho da obra surpreendeu: em duas semanas, a primeira edição se esgotou. A segunda também desapareceu das prateleiras em cerca de 15 dias. Pouco mais de um ano após o lançamento, o livro está na sétima edição.

“Do nada virou um best-seller, já vendeu mais de 10 mil cópias. Os editores se perguntaram como é que um livro sobre a lusofonia pode vender tão bem. Eu acho que os suecos são um povo que gosta de viajar. Nós temos uma história forte com alguns países lusófonos. A Suécia foi o primeiro país europeu a reconhecer a independência de Moçambique, Guiné Bissau e Angola. Durante a guerra colonial, o governo sueco apoiou a luta pela independência”, diz o jornalista, em português com forte sotaque carioca.

O sucesso na Escandinávia, somado ao fato de sua agente literária na Suécia ser uma portuguesa emigrada, favoreceu a publicação da obra em Portugal. Lançado pela editora Objectiva, a edição em língua portuguesa acaba de chegar às livrarias.

Em Lisboa para o lançamento, Brandão Jönsson -o sobrenome português foi incorporado após o casamento com uma brasileira- diz estar curioso para ver as reações dos leitores lusitanos sobre a obra.

O livro é dividido em sete capítulos. Seis deles são dedicados às antigas colônias, cada uma com seu respectivo pecado capital associado: Goa (gula), Moçambique (luxúria), Macau (avareza), Timor-Leste (soberba), Angola (ira) e Brasil (preguiça).

O capítulo final é dedicado a Portugal, que, na avaliação do jornalista, tem como pecado a inveja.

A associação de cada pais e seu respectivo pecado é uma avaliação bastante subjetiva, sendo uma interpretação do autor sobre as características de cada um dos lugares que visitou.

Algumas ligações são mais óbvias, como a relação entre Macau -único território da China em que cassinos são liberados- e a avareza. Outras, precisam de uma certa ginástica filosófica.

“Timor Leste foi o mais difícil, porque é um país muito simpático, muito humilde. Você não poderia pensar em por soberba em um país com 1,2 milhões de pessoas. Mas eles têm um mito por lá: eles acham que são o povo do crocodilo, porque eles querem se sentir melhores do que a Indonésia [que já dominou o país]. Eles querem se diferenciar porque são cristãos, querem mostrar que são mais fortes do que a Indonésia”, explica.

O livro foi escrito em primeira pessoa e é resultado de viagens que começaram em 2016. O texto é uma espécie de grande reportagem, mesclando elementos de história e política de cada região com observações feitas in loco e entrevistas. Muitas entrevistas.

As conversas foram sobre variados temas e com diferentes perfis. Em Moçambique, por exemplo, Brandão Jönsson entrevistou desde pessoas que se prostituem em bares e discotecas até o escritor Mia Couto, um dos principais nomes da literatura africana.

“Aprendi muito com Åsne Seierstad [jornalista norueguesa], que escreveu ‘O Livreiro de Cabul’. Na obra fica muito claro que ela é uma branca de olhos azuis que mora em Cabul, e o livro incorpora isso. Eu quis fazer a mesma coisa: eu sou um sueco mimado, de olhos azuis, que estava vendo as coisas de uma determinada maneira. Eu sempre quis que isso ficasse muito claro”, relata.

No capítulo sobre o Brasil, a associação com a preguiça é feita em forma de crítica social, chamando a atenção para o fato de que os séculos de escravatura fizeram com que muitos brasileiros tivessem aversão ao trabalho doméstico e a outras formas de ocupações.

Certos setores pouco produtivos do funcionalismo público e as generosas pensões para filhas de militares também são alvo de crítica.

“Eu sou do país da Ikea, onde temos por hábito fazer tudo sozinhos. Infelizmente, no Brasil ainda tem isso de deixar o outro fazer. Mas é claro que há quem trabalhe muito, como as pessoas que moram no subúrbio e acordam às 4h30 para pegar o trem e ir para o serviço”, explica.

No livro, o jornalista sueco descreve o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como a definição do brasileiro preguiçoso.

“Bolsonaro é um exemplo típico da preguiça do homem branco no Brasil. O nacionalista de direita acusa os descendentes das pessoas escravizadas de não trabalharem, apesar de terem sido eles quem, literalmente, construíram o país. Na realidade, Bolsonaro é quem não faz muito: foi expulso do Exército logo no grau de capitão, por conduta imprópria, e durante as suas quase três décadas como deputado só conseguiu a aprovação de dois projetos-lei – uma média de uma lei a cada quinze anos. Nem um caracol trabalha tão lentamente”, escreve.

Em seu capítulo sobre Portugal e a inveja, o jornalista sueco recorre ao pensamento do filósofo português José Gil: :”ele fala que inveja em Portugal não é um sentimento, é um sistema. Isso, é claro, é uma provocação”, diz o autor.

Segundo Henrik Brandão Jönsson, Portugal gosta de falar das glórias do passado e da época dos Descobrimentos sem tocar em outras questões que também fizeram parte da colonização.

“Tem o outro lado também: quem inventou o tráfico transatlântico de escravos foram os portugueses. Claro, existiam muitos escravos antes, como no Egito e em outros lugares, mas essa coisa de fazer negócio em larga escala com a escravidão, isso foram os portugueses”, diz.

Apesar das críticas, o livro exalta muitas qualidades e pontos históricos e culturais de Portugal e de suas antigas colônias.

“O livro é uma declaração de amor ao mundo lusófono, não estou só criticando. Como eu sou sueco e não tenho nada a ver com o mundo lusófono, eu posso criticar e elogiar. Se fosse um português escrevendo sobre a mesma coisa, poderia acontecer de pender mais para o elogio ou para a crítica. Mas, como eu tenho um olhar de fora, consigo avaliar como jornalista aquilo que é bom ou rui”, resume.

A obra, por enquanto, não tem previsão de lançamento no Brasil.

| IDNews® | Folhapress | Via NMBR |Brasil

Beto Fortunato

Jornalista - Diretor de TV - Editor -Cinegrafista - MTB: 44493-SP

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