Lula perde para Delcídio na Justiça
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Lula perde para Delcídio na Justiça
Ex-presidente pedia indenização de R$ 1,5 milhão por dano moral ao ex-senador
21ABR2017| 8h38
Lula perdeu o embate para Delcídio Amaral (ex-PT/MS). Em decisão de 15 páginas, o juiz Maurício Tini Garcia, da 2.ª Vara Cível de São Bernardo do Campo (Grande São Paulo), julgou improcedente ação do ex-presidente contra o ex-senador que, em delação premiada na Operação Lava Jato, o acusou de obstrução de Justiça por supostamente tramar pelo silêncio do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, em 2015 – na ocasião, Cerveró estava em vias de fazer delação premiada. Lula queria indenização de R$ 1,5 milhão por dano moral.
O magistrado condenou Lula a arcar com “as custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de 15% sobre o valor atualizado da causa”, ou R$ 225 mil. O ex-presidente pode recorrer.
Na ação, Lula alegou que tem 40 anos de vida pública e já exerceu o cargo de Presidente da República. “Foi afetado em sua dignidade e integridade moral em virtude das falsas imputações deduzidas pelo réu (Delcídio).”
O ex-presidente argumentou que na delação premiada, Delcídio atribuiu a Lula plano para “segurar” a delação premiada de Cerveró. “Tal solicitação do autor (Lula) jamais ocorreu, tanto que Nestor Cerveró e outras testemunhas ouvidas em 8 de novembro de 2016, na audiência realizada na 10.ª Vara Federal de Brasília confirmaram jamais ter recebido qualquer assédio direto ou indireto do autor (Lula).”
Os advogados de Lula acrescentaram que “as afirmações impugnadas foram prestadas durante o período em que o réu (Delcídio) esteve preso em um quarto-cela sem luz, que enchia de fumaça do gerador instalado no ambiente ao lado”. “Em determinada ocasião o gerador funcionou e sua fumaça invadiu o recinto onde estava o réu, causando situação de intensa aflição. Tal situação compromete a validade da delação premiada realizada pelo réu, dado que afeta o requisito legal da voluntariedade (Lei 12.850/13, art. 4º, caput).”
O ex-senador, que chegou a ser preso em novembro de 2015, fechou o acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal, homologado pelo Supremo Tribunal Federal, “do que emerge a validade e a relevância das informações que nela foram prestadas, bem assim a licitude das provas colhidas a partir do mencionado instituto processual penal”.
Delcídio atribuiu a Lula envolvimento na trama para comprar o silêncio de Cerveró que, afinal, acabou fazendo delação premiada e saiu da cadeia da Lava Jato.
“A pretensão indenizatória deduzida na demanda é fundada na suposta falsidade das informações prestadas pelo réu no curso de procedimento de delação premiada, em que foi imputada uma tentativa de obstrução da Justiça, na forma de tentativa de
convencimento de prepostos de terceira pessoa a evitar envolver o autor e seus correligionários em prática de atos ilegais na gestão de empresa estatal”, assinala o juiz Maurício Tini Garcia.
O magistrado assinalou. “Não se discute que, no mesmo patamar de importância, estabelece a Carta Magna à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (artigo 5.º Inciso X, da Constituição). O direito à honra é contrabalançado pela responsabilidade nas esferas cível e criminal daquele que supostamente afronte o ordenamento jurídico pátrio.”
Maurício Tini Garcia observa que é previsto no artigo 6.º, I, da Lei 12.850/13, “o caráter personalíssimo do acordo de delação premiada, a impedir sua impugnação por coautores ou partícipes do colaborador na organização criminosa e nas infrações penais investigadas, ainda que sejam expressamente mencionados no relato de colaboração”.
“O acordo de delação premiada firmado pelo réu foi integralmente homologado, sem qualquer glosa, e, por isso, obteve eficácia que possibilitou a aplicação da sanção premial nele prevista. Nada nos autos sinaliza para imprecisão na identificação de coautores e partícipes de suposta organização criminosa ou dúvida na revelação de estrutura hierárquica e de divisão de tarefas, entre outros requisitos legais do instituto, tanto que sequer a petição inicial menciona a revogação da delação premiada firmado pelo réu”, pondera o magistrado.
“A validade e a eficácia da delação premiada firmada pelo réu, e homologada pelo Supremo Tribunal Federal, infirma de forma inequívoca a alegação de ilicitude da conduta que sustenta a pretensão indenizatória deduzida na demanda e, por
conseguinte, inviabiliza o acolhimento da responsabilização civil do réu pelos danos morais descritos na petição inicial”, anotou o juiz de São Bernardo do Campo.
“Isto porque os pressupostos da obrigação de indenizar são: ação ou omissão do agente, a culpa, nexo causal e o dano”, segue Maurício. “Na hipótese dos autos, a teor dos fundamentos já expostos, não sobressai dos fatos afirmados pelo autor (Lula) a culpa ou o dolo do réu (Delcídio) tampouco nexo de causalidade entre os danos e uma ação ilícita do último. Em outras palavras, conclui-se que o réu, exercendo regularmente seu direito, formulou acordo de delação premiada que foi homologado pelo Supremo Tribunal Federal e cuja eficácia é mantida nos dias atuais.”
Maurício assinala que “não cabe ao juízo cível apreciar a relevância e a idoneidade das informações que ensejaram a homologação do acordo de delação premiada no Supremo Tribunal Federal, mormente porque esta demanda não é fundamentada na absolvição sumária do autor pelos fatos imputados pelo réu”.
“A propósito, ainda que o depoimento do réu estivesse protegido pelo segredo de Justiça, não medraria a pretensão do autor, já que o artigo 5.º, LX, da Constituição Federal, dispõe que somente a lei poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”, observa o magistrado.
“O mencionado dispositivo constitucional tem por premissa o princípio republicano de que as coisas do Estado têm que ser divulgadas ao público, tanto que sequer utilizou o vocábulo sigilo ou segredo, preferindo utilizar restrição como exceção à regra geral da publicidade”, alerta o juiz. “Não se questiona que o excesso deve ser punido protegendo-se a imagem de quem nela é citado. Sem prejuízo, em hipótese semelhante envolvendo pessoas públicas que litigam acerca de danos morais fundados em supostas ofensas divulgadas ao público, emerge imperioso colacionar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em acórdão da ministra Nancy Andrighi.”
“Significa dizer que aqueles que optam pela vida política, muito mais que o cidadão comum, sujeitos estão ao escrutínio popular sobre seus atos, além de submetidos a imputações acerca da probidade e honestidade de suas ações”, destaca o juiz. “Bem por isso, não emerge adequado que, por meio de fixação de indenizações protetivas da moral, o Poder Judiciário interfira para desestimular a publicidade de atos de interesse público, mormente quando o ordenamento jurídico vigente disponibiliza ao imputado amplo direito de defesa na esfera criminal e administrativa, com várias instâncias recursais, onde a idoneidade de suas ações políticas, a legitimidade do patrimônio amealhado durante sua vida pública e os sinais externos de sua riqueza e de seus parentes próximos sempre poderão ser objeto de justificativa ou questionamento.”
“Vale ressaltar que os demais argumentos afirmados pelas partes são desprovidos de força para infirmar a conclusão adotada neste julgado e, por isso, não merecem acolhimento. Nesse contexto, não comprovada ilicitude da conduta do réu e diante da ausência dos danos afirmados na demanda, é medida que se impõe a improcedência do pedido de declaração de violação ao artigo 5.º, incisos V e X, artigos 12, 17 e 21, todos do Código Civil, bem como da pretensão de ressarcimento de danos morais. Posto isso, e pelo mais que dos autos consta, julgo improcedente o pedido inicial.”
“Condeno o autor nas custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de 15% sobre o valor atualizado da causa.” (Julia Affonso, Ricardo Brandt e Fausto Macedo)