‘Rita Lee me deixou várias missões’, diz Mel Lisboa, que viverá a cantora de novo
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A atriz se prepara também para voltar a interpretar a cantora no teatro.
Foto: Agência News
Mel Lisboa, de 42 anos, chega para a entrevista de legging colorida, camiseta de ginástica e uma taça com cerveja sem álcool. Era uma tarde de sábado e ela tinha peça à noite. Lisboa está em cartaz no Tuca, o teatro da PUC, em São Paulo, até o dia 30 de julho com a peça “Misery”, baseada no livro de Stephen King. A sessão aos sábados começa às 20h, e a atriz costuma chegar uma hora antes do espetáculo para se preparar.
Mas a sua personagem mais marcante, Rita Lee, a cantora paulistana que morreu em maio, está de volta à vida da atriz. Ela terminou no final de junho de gravar o audiolivro de “Outra Autobiografia”, livro póstumo de Rita Lee, lançado duas semanas depois de sua morte e que conta sem firulas como foram os últimos três anos, em que Rita enfrentou o câncer. “Foi um pedido que ela deixou para mim, e fiz por ela”, diz Lisboa.
A atriz se prepara também para voltar a interpretar a cantora no teatro, agora com uma versão da peça inspirada na primeira autobiografia da cantora, lançada em 2016. “Dessa vez o projeto é meu, junto com o time da Rita, e vai ser uma nova peça. Mas com a mesma equipe do musical que fizemos em 2014”, conta.
Foi outro pedido da cantora, que, em 2020, no início da pandemia, ligou para a atriz dizendo que desejava que a peça “Rita Lee Mora Ao Lado” voltasse aos palcos. Ainda sem data para estrear, mas com a torcida do elenco e da protagonista seja neste ano, a peça não tem nem título definido, nem teatro escolhido. Só a certeza da equipe de que vai acontecer.
“Ela me deixou com essas missões”, diz Lisboa. “E o que poderia ser melhor que isso, na vida de uma atriz?”.
Na mão que não segurava a cerveja, Lisboa trazia uma caixa branca de papelão quadrada enorme. Dentro, embrulhado em um papel de seda, o vestido que ela usa nas fotos dessa reportagem, feitas por Karime Xavier. A roupa era de Rita Lee, que comprou o vestido estilo romântico a pedido de João Gilberto, quando participou de um especial da Globo, em 1980, cantando “Jou Jou Balangandans” ao lado do músico baiano.
Rita deu o vestido de presente para Mel Lisboa quando foi assistir pela primeira vez ao musical “Rita Lee Mora ao Lado”, em 2014. Ela foi de surpresa no teatro, não pediu convite nem deixou que ninguém avisasse o elenco.
“A plateia estava lotada e eu sabia que o Ney Matogrosso tinha ido assistir, tinha uma cena da peça em que ele aparecia, porque foi o Ney que apresentou a Rita ao Roberto de Carvalho”, conta Lisboa. “Quando o espetáculo terminou, chamamos o Ney para subir no palco, e, de repente, olhei para o outro lado e a Rita Lee estava lá, subindo no palco também. Eu desabei de tanto chorar, foi muita emoção”.
Depois que as cortinas se fecharam e várias pessoas na plateia filmaram o encontro, Lisboa, Ney e Rita ficaram conversando na coxia, e então uma assistente da cantora chegou com a caixa e Rita entregou a Mel o vestido, de presente. Como não poderia deixar de ser, serviu perfeitamente na intérprete.
Mas estava amassado dentro da caixa naquele sábado de junho, daquele jeito não ficaria bem nas fotos. Então Mel correu até sua casa, por acaso o apartamento acima do local onde acontecia a entrevista, em um condomínio de prédios na Aclimação –no qual, por coincidência, nasci e fui criada–, e passou a roupa a vapor.
Arrumamos uma arara da minha irmã, a jornalista Ana Ribeiro, que mora no apartamento dos meus pais e é vizinha da Mel, e a responsável por eu conhecer a obra de Rita Lee desde os quatro anos. Penduramos o vestido, Mel se ajoelhou na frente dele com a passadeira a vapor e, voilà, tínhamos figurino.
A atriz já chegou maquiada, o cabelo longo e com franja é o que ela usa normalmente. Vimos várias vezes o vídeo no YouTube de Rita Lee cantando com João Gilberto no especial da Globo com o mesmo vestido, mas em nenhuma cena fomos capazes de concluir o que ela usava nos pés. Mel fez as fotos descalça.
Mas mesmo depois de ganhar esse vestido e ter Rita Lee na plateia, a atriz só teve segurança de que tinha dado conta de interpretar a cantora quando a própria Rita voltou a ver o espetáculo, no mesmo ano, dessa levando o namorado, Roberto de Carvalho.
A peça saiu de cartaz em 2016, e, muito devido ao sucesso que fez e da história que contava, inspirada no livro “Rita Lee Mora ao Lado”, uma biografia fictícia baseada nos diários de uma vizinha também fictícia da cantora, chamada Bárbara Farniente, escrita em 2006 por Henrique Bartsch, a própria Rita Lee se inspirou a contar a sua versão.
“Rita Lee: Uma Autobiografia”, que empresta o título da autobiografia clássica de Angela Davis, uma filósofa americana, ex-integrante do grupo Panteras Negras, foi lançado em 2016 pela editora Globo e virou imediatamente um fenômeno de crítica e de vendas.
Mas foi só no ano passado que a editora decidiu fazer uma versão em audiolivro. Rita Lee já enfrentava o câncer no pulmão e o tratamento pesado que fez para tentar se livrar dele e pediu a Mel que gravasse o audiolivro.
“Fiquei muito honrada, mas ao mesmo tempo muito aflita, como eu poderia ler em primeira pessoa a autobiografia dela?”, lembra Lisboa. “Mas ela já estava muito fragilizada e uma leitura dessas exige fôlego, então encarei o desafio”.
“Fiz um estudo muito profundo para interpretá-la no teatro”, conta a atriz. “As expressões corporais, as caras e bocas, as brincadeiras que ela fazia. Aí você junta tudo isso com a caracterização, maquiagem, figurino, e constrói uma imagem que funciona no palco. Mas quando você tira tudo isso e fica só a voz é mil vezes mais complicado. Ela tinha um jeito diferente de falar, um jeitinho só dela”.
No começo deste ano, Mel Lisboa e Rita Lee participaram, juntas, da campanha de lançamento da série “Daisy Jones and the Six”, do canal de streaming Prime Video. Com Riley Keough, a neta de Elvis Presley, no papel de uma roqueira fictícia dos anos 1970 chamada Daisy Jones que se junta a uma banda chamada The Six, mesmo nome da primeira banda de Rita Lee, formada na época do colégio ainda, antes dos Mutantes.
Rita escreveu uma carta a Daisy Jones, que tem o mesmo sobrenome dela, na qual dizia: “Tem sempre um boy para dizer que para fazer rock tem que ser macho… boring. Mas a gente vai lá e mostra que fazemos músicas tão boas ou melhores que a deles. Tô sabendo que vai rolar uma entrevista sobre o fim da banda. Seja fiel a sua verdade. Palco e fama só são bons quando a gente pode dizer o que acredita”.
Caracterizada como Rita Lee, Mel Lisboa leu a carta no anúncio do canal. Foi o último trabalho que fizeram juntas, mas sem se encontrarem fisicamente. O último encontro foi alguns anos antes disso, quando Rita Lee lançou o livro infantil “Amiga Ursa: Uma História Triste, Mas com Final Feliz”, em 2019.
“Foi no Teatro Eva Herz, da Livraria Cultura”, lembra Lisboa. “Levei meus filhos, e ela fez uma leitura do livro com as crianças, que foram todas para o palco com ela. Aí ela cantou ‘Mania de Você’, e eu gravei. O vídeo estava na exposição que o MIS fez com as coisas dela no começo do ano passado”, afirma a atriz, que também emprestou o vestido branco dessas fotos para a exposição.
Foi a última vez que Mel esteve na presença de Rita Lee. Mas não terá sido a última vez que Rita Lee estará com Mel Lisboa.
|IDNews® | Folhapress | Beto Fortunato |Via NBR | Brasil